terça-feira, 24 de julho de 2012

Madressilva



Madressilva tinha a mania de falar sozinha. Era uma das coisas favoritas para fazer no tempo livre. No ônibus, caminhando na rua, no seu quarto, no intervalo do trabalho, somente durante o trabalho não pudia fazê-lo para não se desconcentrar, porém soltando uma ou outra exclamação sonora.
Adorava conversar com outras pessoas também. Mas a conversa consigo mesma não a enfadava, afinal, ela conhecia bem seus gostos, seus conhecimentos, poderia argumentar com deduções a respeito de qualquer coisa porque ninguém lhe exigiria argumentos sólidos, não precisaria mudar de assunto mesmo quando não quisesse, não era obrigada a falar coisas para agradar aos outros, porque estava simplesmente conversando consigo mesma.
Porém quando andava na rua falando sozinha, as pessoas ficavam-na observando, julgando-a: “Louca!” “Sai de perto dela filho, senão ela vai te roubar!” “Se interna, filha da puta!”
Procurou médicos e psicólogos. Porém nenhum conseguia a curar da sedução que era conversar consigo mesma. Não havia dia que ela não trocasse meia dúzia de palavras com seu “eu interior”.
Quando já havia perdido as esperanças, quando já havia dado entrada para se internar numa clínica psiquiátrica, ela passou na rua e viu uma senhora falando alto e gesticulando muito. O mais engraçado é que as pessoas passavam por ela e ninguém falava nada. Chegou perto e percebeu que a senhora segurava na mão um celular, e neste momento teve a bela ideia de ligar para si mesma toda vez que quisesse falar sozinha e fazendo isso, ninguém mais a observou estranhamente e nem a chamou de louca.
Segurando um celular na mão, ela curou sua loucura. 

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Angélica - Capítulo 1



Capítulo 1

Já fazia uma semana que John havia morrido. Seus 4 anos de casada foram os mais perfeitos de sua vida, revisava Angélica. Cada talher, cada copo, era motivo para chorar. Não aquele dia. Já havia chorado durante toda a semana. Miguel, o filho do casal de apenas dois anos, esteve na casa de seus pais, para um longo passeio a ponto de suavizar toda a situação e também para que Angélica pudesse desabar um pouco, sem precisar parecer forte para seu filho, pelo menos durante alguns dias. Sabe ela que cada olhar no rosto daquele menino vai remeter-lhe a John, aqueles olhos negros e amendoados, bem parecidos com o de seu pai... Aquilo era só uma preparação, um treino, pra conseguir olhar para seu filho e não chorar.

Quem diria! Viúva aos 28 anos! A sua vida, toda sua trajetória de vida, parecia escrita junto a ele. Conheceram-se na adolescência, na escola, apesar de não terem namorado de cara, eram apenas amigos. Ele nutria uma paixão secreta por ela, situação que estourou assim que ela arranjou um namorado! Este melhor amigo dele na época.
Porém, o destino sabia o que fazer. Acabou fazendo faculdade no mesmo campus, o que acabou os aproximando e a relação de Angélica com Paulo, antigo namorado, estava indo de mal a pior. Tudo colaborava para a aproximação dos dois. Após a formatura de Angélica como comunicadora social, eles começaram uma relação séria e logo veio o pedido de noivado e, consequentemente, casamento. Era uma sintonia tremenda. Os dois praticamente pensavam igual, queriam as mesmas coisas. Miguel foi apenas consequência de tanto amor, um fruto que veio pra alegrar a vida e a família de ambos. Porém o destino preparou uma armadilha e tanto naquele dia de chuva.

Um acidente de carro, desses que não se explica, onde John passava sempre, foi o motivo da morte dele. Não houve momentos de despedida no hospital, com juras de amor antes da morte, não. Foi um acidente fatal, desses que despedaça completamente o carro, que ele morreu no momento da batida, de traumatismo craniano. Foi como uma porrada, dessas que nos deixa rolando no chão por horas a fio. Era assim que Angélica sentia-se: golpeada fatalmente.

Era o ultimo dia que pretendia visitar aquele cemitério, de apenas algumas quadras da sua casa. Já estava procurando uma nova casa, num lugar distante dali, que não lembrasse em nada aquele por quem foi apaixonada. Era início de verão, a tarde era ensolarada, agradável. Colocou um vestido de verão, de saia rodada. Uma trança no cabelo, havaianas e uma flor de mato colhida durante o caminho era o visual que ostentava.

Já dentro do cemitério, passava pelo caminho em direção ao túmulo de John. Viu descer da mesma direção um homem bem distinto, branco, dos olhos verdes e cabelos bem negros e lisos, meio despontados na frente. Usava uma camisa de botões preta e uma calça jeans com tênis all star. Estava sério, meio inconformado, mas normal. Era raro ver alguém feliz naquele cemitério. Com certeza deveria ter motivos parecidos com os dela.

Ao som de He War – Cat Power tocando no mp3 do seu celular, ela chega ao túmulo. Agora, mais calma, até mesmo conversa com John, contando sobre seu dia, trivialidades sobre o que fez no almoço, o fato de estar de TPM e outras coisas do cotidiano, que ele costumava às vezes prestar atenção.
Olhou para a lápide e viu uma rosa, deitada sobre o esquife com um pequeno cartão do lado. Estranhou. A última chuva de primavera havia levado embora todas as flores e lembranças deixadas para o defunto. Aquela rosa era nova, não estava despetalada, era de hoje...

O texto do cartão era apenas algo escrito a mão livre de caneta azul. Merci... Obrigado em francês. A letra parecia um pouco com o convencionalizado como letra de médico, uma letra ruim, que dá pra entender o que está escrito, mas sem preocupações estéticas.

Não se lembrava de ninguém que tivesse a letra parecida, porém, com um instinto curioso que sempre fez parte de sua personalidade, guardou o cartão no bolso do vestido. Afinal, era o túmulo de seu marido, interessava-lhe muito saber quem lhe escrevia coisas em francês.

Desceu o pequeno morro do cemitério de volta pra casa, aliviada, porém intrigada. O fato da pessoa ter escrito merci não significava nada, até ela reconheceu que aquilo era francês. Isso não era coisa de pessoa francesa, mas de alguém que tinha certa intimidade com o falecido, que tinha no mínimo, certa cumplicidade, um colega de trabalho, uma amiga, uma ...

Suspendeu os pensamentos que acabara de ter, e respirou fundo... Que loucura era essa? Ele nunca escondera nada, nunca houve indícios de nada, ela sabia de toda sua vida, conhecia todos os amigos dele, os fins de semana ele sempre a privilegiava, a ponto de alguns amigos dele reclamarem...

Balançou a cabeça e viu que estava cansada, resolveu ir pegar o ônibus. Tinha um que iria deixa-la na porta de casa.

Sentou-se num dos abrigos de ônibus colocado recentemente pela prefeitura do município. Imersa em seus próprios pensamentos, relembrando as coisas boas do tempo de casada e no que iria fazer, agora que eram apenas ela e seu filho. Morar perto de sua mãe seria uma boa opção, pois aí sua mãe cuidaria do Miguel enquanto ela procurava trabalho. Qualquer que fosse, atendente de loja, secretária...

- Com licença, desculpe atrapalhar, estou vendo que está tão concentrada, mas preciso de ajuda. – Era o belo jovem, de olhos verdes do cemitério, estava por ali, meio perdido há algum tempo. – é que eu não estou acostumado a vir para cá, não me lembro do ônibus que peguei para vir... O que volta pra cidade...
- Ah, vou ficar de olho também, estou esperando o mesmo ônibus.
- Ok, qualquer coisa me dá um toque viu...
- Tá, pode deixar.

Em alguns minutos, o ônibus chegou e os dois embarcaram. Ela, por ter entrado primeiro, sentou-se na janela, para apreciar a brisa gostosa do fim de tarde. Ele, mesmo com o ônibus vazio, sentou-se ao seu lado.
- Me desculpe, sei que queria sentar sozinha, mas odeio andar de ônibus sozinho, quase não pego ônibus na verdade.
- Não, tudo bem, só que vou descer logo... Só peguei este ônibus porque estou cansada...
- Você mora aqui perto?
- Sim, há alguns quarteirões...
- Aqui é um bairro calmo né?
- É sim, mas vou me mudar... Esse lugar me lembra de muitas coisas que quero esquecer... Disse olhando perdidamente para a janela.
- Ah... Estamos vindo do mesmo lugar... Esqueci...
- Deixa pra lá, já chorei tudo que tinha que chorar... Agora posso dizer que estou bem, pronta pra começar do zero de novo.
- Sua mãe? – Pergunta intrometida, mas num tom natural, apenas para dar andamento ao assunto.
- Não, meu marido...
- Ah... Como se chama?
- Angélica e vc?
- Eu me chamo Taylor...
- Aham... Olha, já estou chegando, vou ter que descer...
- Ok... Que dê tudo certo pra você... Merci...
- Nada, eu que agradeço... Pela companhia...

Puxou a famosa cigarra e desceu, quando colocou o segundo pé no chão é que se deu conta do “merci” que Taylor havia usado. Ele? Ele deixou o cartão pro meu marido? Quem era Taylor? Já tinha um nome pra pesquisar...

// Em off: na postagem anterior, está um preview da história, com fatos antecessores ao acidente. beijos a tod@s\\

sábado, 18 de dezembro de 2010

Angélica

Mudando o formato das postagens que tenho feito por aqui, estarei incluindo a partir de hoje no blog a série quinzenal: Angélica
Será dividida em dez capítulos inicialmente.



Preview

Era o momento de ligar para John, já passava das dez e ele não havia chegado. A chuva forte, as estradas alagadas, o caos da cidade provavelmente estariam o impedindo de chegar em casa. O celular dele estava sem sinal e a tempestade estava forte. Torcia apenas para que ele estivesse seguro em algum lugar.

Havia no mês anterior, comemorado as bodas de algodão e também sua recente gravidez, os enjoos durante a festa foram o vestígio que daquilo que eles mais aguardavam.

John era um marido excepcional. Angélica poderia ir a hora que fosse do dia que o encontraria no trabalho, não bebia, gostava de futebol, porém não era fanático, apaixonado o bastante para que seu futuro filho também tivesse gosto por esportes. Nesses dois anos e durante todo o tempo em que se relacionaram, John não dera motivos maiores para aborrecer Angélica.

Horas depois, quando Angélica já cochilava no sofá com a televisão ligada no Jornal da Globo, escuta o barulho da porta do apartamento se abrindo. Era John, meio ensopado com uma cara meio fechada.

- Está tudo bem amor? - Pergunta Angélica se aproximando e dando um beijo nele.

- Sim... - Diz ele, sem puxar muito assunto, correspondendo pouco ao beijo de Angélica.

- E essa chuva eim... Dirigir nessas condições deve ser um caos... - Tenta conversar.

- Nem é... – Diz ele dando uma breve pausa, olhando para as lâmpadas. – Consegui chegar né? Tava meio parado mas dei um jeito...

- Poderia ter dado um jeito de ligar também, eu estava preocupada.

- A bateria estava meio fraca, prestes a cair e o sinal lá onde trabalho estava variando... Quis economizar bateria caso houvesse alguma emergência e eu precisasse dormir por lá. Vim na primeira estiagem pegando um pouco de trânsito.

- Aham... Angélica consentiu porém ficou meio estática com tantas explicações. Ele nunca foi disso, confiava nele. Mas estava tão tranquila por ele estar bem que relevou pequenos detalhes.

Fez um chá para ajudar ele dormir. John permanecia monossílabo enquanto tomava. Suas respostas eram sim, aham, ah é?, não, E suas afirmações eram to com sono... to cansado...

- Eu também estou cansada. Vamos dormir então. O soninho está me pegando... haha! – Tenta uma piada sem graça pra descontrair, o lado humorístico nunca foi o forte de Angélica, apesar de ser de bem com a vida...

Porém sua intuição falava. Havia algo estranho acontecendo, porém queria expulsar aquelas cismas da sua mente. Não era nada... Era só uma noite que ele chegou tarde. Melhor ir dormir mesmo. John, por sua vez, correu para o chuveiro, tomar uma ducha quente pra relaxar. Angélica foi direto pra cama, pois já estava de banho tomado. Ficou esperando seu amado sair do banho enquanto pegava no sono.

Ele chegou instantes depois, com uma roupa que usa para dormir e se jogou na cama dando um beijo em Angélica e dormindo meio que instantaneamente. Com alguns minutos, ele já ronronava.

- Tem alguma coisa errada... - Murmurou baixinho sem que ele ouvisse. Num salto levantou-se e foi na bolsa dele, olhar o celular dele. Nada. Nem mensagens recentes, só as que ela mesmo havia mandado. As ligações perdidas dela, chamadas recentes só as do trabalho e as pro telefone residencial. Mas havia um detalhe, alguma coisa cheirando mal. Aí que ela se tocou.

- A bateria! – Não que a bateria estivesse fraca. Estava médio cheia. Cheia o bastante para fazer uma ligação ou receber... E ele disse que estava economizando para uma emergência. Havia bateria o bastante para várias emergências.
Nada fez. Desligou o celular, colocou na bolsa dele e deitou, com um pouco de dificuldade dormiu...

Porém no dia seguinte, e nos outros dias, durante mais dois anos de casados, ele voltou a ser o homem maravilhoso de sempre, e melhor ainda: um maravilhoso pai! Miguel seu filho o amava demais, Angélica por vezes achava que ele amava mais John do que a ela. Mentiras? Puladas de cerca? Se houveram ele cobriu muito bem... Bem de uma tal forma que Angélica se convenceu e apagou o capítulo do celular de sua mente.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Blue




Azul, foi a cor que Blue escolheu para o vestido de gala daquela festa. Era a melhor amiga da noiva e a amante favorita do noivo. Durante a tediosa cerimônia, ligou o mp3 em seus pagodes favoritos.
Era o momento do beijo. Blue estava com fome. A maquiagem precisava ser retocada e a vontade de ir ao banheiro era grande. O cabelo que levou horas para fazer no salão, ficou estranho com a umidade do lugar. Sua aparência era boa, porém pouco lhe agradava.
A vontade dela era de não estar ali. A vida já não fazia sentido e o noivo já não a agradava mais. As promessas se foram e os desejos também. A cara dela parecia tão tediosa quanto a cor azul de seu vestido.
Tomou um porre daqueles na festa e disse coisas inconfessáveis, sobre a vida secreta com seu amante.
- Ele gosta de levar dedada no cú!
Foi escurraçada da festa pelos convidados, saindo bêbada e cambaleante com a sombra de olho borrada e o batom azul todo melado feliz da vida, plantando a semente da discórdia entre os recém-casados.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Açucena




Açucena estava angustiada.
Era aquele dia que ela iria dizer para seu melhor amigo que o amava de forma intensa, que mesmo se o mundo se acabasse, agora que ela iria dizer o que pensava, a morte poderia visitá-la a qualquer hora que não se importaria. Mas antes precisava encontrá-lo.
Colocou o mais belo vestido de seu armário e o perfume mais doce de sua coleção. Soltou seus eternos cabelos presos sobre as suas costas e deixou que os cachos naturais mostrassem a verdade que havia em sua alma. Não havia mais motivo para esconder seu enorme e belo cabelo dourado misturado com mel.
Ao sair na rua, todos ficavam admirados em como era bonito seu cabelo. Alguns homens só continuavam a caminhar quando ela virava a esquina e perdiam de vista o longo balanço de seus cachos. Até mesmo algumas mulheres ficavam olhando petrificadas. Era tão bonito que sequer inspirava inveja. Era uma beleza que ninguém se atreveria a querer, alguns achavam que ela era abençoada, outros achavam aquilo uma maldição demoníaca.
Pisou com salto quinze no chão do quiosque onde se encontrariam. Uma noite gostosa de verão com uma breve brisa que cortava seu rosto e teimava em levantar seu vestido. Uma mulher que exalava sensualidade, sem fazer força alguma pra isso.
Sentou-se na mesa ao lado de seu grande amor.
Fizeram os pedidos e esperaram em silêncio.
Entraram num doloroso jogo de mímica e poder. Enquanto as pessoas da mesa em volta admiravam a beleza daquela mulher e sentiam inveja daquele homem, o pensamento de ambos flutuava por lugares inimagináveis. Ela olhava majestosamente para a lua, ao mesmo tempo admirando sua beleza e posando como uma Vênus, com os braços estendidos e fechando os olhos em alguns momentos, sentindo o cheiro da brisa marítima. Enquanto ele olhava a carta de bebidas, escolhendo cuidadosamente o que iria beber e tentava com a outra mão pegar o seu celular para desligar.
- Vinho? Perguntou ele.
-Branco. Respondeu ela.
Ela fazia o balanço de seus sentimentos por ele e percebeu que se sentiu mais viva com os olhares das pessoas na rua, do que por aquele gesticular metódico que ele demonstrava, sequer elogiando seus esforços em ficar bonita.
-Desculpe o que você queria falar Açucena?
-Nada. Descobri que me amo demais. Te amei mas passou.
Ele olhando atônito para aquela mulher, ficou sem reações e sem ter o que dizer. Enquanto ela deixava uma nota de cinqüenta reais na mesa e saia correndo para a praia, ele finalmente admirava a mulher que havia perdido. Um olhar brilhante, uma mulher que era pura sedução e passou todos estes anos disfarçada de sua grande amiga e agora partia para voar como uma gaivota adulta, numa vida que não lhe pertencia mais.
Ela entrou na água de vestido e tudo, e ficou brincando na areia até amanhecer. Estava feia de novo, com cabelo cheio de areia, seu vestido molhado, seus saltos quebrados e fedendo a maresia. Porém sua alma resplandecia, finalmente começou a viver sua própria vida. E isto estava claro no olhar das pessoas pela rua. Um olhar de inveja, por ela ser livre.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Magnólia



Era tarde naquele dia de primavera. As primeiras gotas de sereno caíam sobre o rosto de Magnólia enquanto era puxada pelo seu namorado.
Ela sabia que naquele momento daria seu primeiro beijo debaixo daquela amendoeira.
Quando encostou os lábios nos dele, num beijo melecado e barulhento que quase a deixou tonta, ela chega a uma conclusão:
Que seu primeiro beijo teve gosto de feijão.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Hortência



Hortência chegou da escola e trancou-se no armário de roupas do seu quarto. Tudo que queria era encontrar o “espírito” que morava em seu armário. Dizia ela ser seu melhor amigo. Alguém com quem conversava e que a entendia, que a dava conselhos...
- Hoje eu joguei vôlei e fiz cinco pontos... Dizia ela
Silêncio em seguida.
Seus pais já haviam contratado psicólogos, psiquiatras, psicanalistas, padres exorcistas, mães de santo, cartomantes... e nada... Eles já estavam preocupados com sua filha única. Passou dois dias trancados lá. Ela e o espírito. Até que na terceira noite, eles não agüentaram e abriram a porta.
Um cheiro forte subiu. Era o corpo morto de Hortência jogado no chão com uma faca de cozinha enfiada no peito. Ao lado, em cima de uma calcinha, uma carta escrita com uma letra de forma estranha, que não era de sua filha.
- Ela precisava de amor. Vocês não deram, eu a levei para ser feliz comigo em meu mundo. Ass: Espírito.
A mãe levou dez anos para sair do hospício depois do ocorrido.

domingo, 14 de junho de 2009

Íris



Preparava o ritual. Chumbinho, inseticida, gasolina e querosene misturados num só copo. Deitou e esperou dar meia-noite. Durmiu.
Era quinze pra meia-noite o despertador tocou. Acordou e vestiu a roupa que mais gostava. Um lindo e sensual vestido vermelho. Colocou maquiagem e penteou o cabelo, mais rápido que o costume.
A lua estava bonita. A noite, a mais linda.
Quando o relógio da sala deu os primeiros badalos, segurou o copo com as duas mãos e foi em direção a janela. Pegou o copo e o conteúdo dele e jogou rua abaixo.
- Hahaha!!!!! Seu idiota! Você não vai me matar! Gritou Íris rindo tanto que quase teve um ataque do coração.
As poucas pessoas que estavam na rua entraram para suas casas, assustadas com aquela gargalhada.

sábado, 13 de junho de 2009

Margarida



Entrou e sentou na primeira cadeira vazia que viu no cinema. O filme já havia começado. Tomou um belo toco do garoto da escola com quem tinha marcado de ver o filme. Já que estava ali, não ia perder a viagem.
Um cara lindo estava sentado em sua frente e volta e meia olhava pra traz, torcendo o pescoço pro lado que ela estava. Enquanto todos gritavam de susto naquele filme de terror, ela não tirava os olhos dele. Acreditava que não voltaria pra casa sozinha.
Até que um outro cara lindo atravessa a porta do cinema com duas pipocas na mão e senta ao lado do bonitão, tascando um longo e melecado beijo. Ela, atônita sem entender o que acontecia, percebeu o engano que cometera.
- Nunca mais me sento ao lado da porta de entrada! Exclamou ela baixinho, morrendo de raiva, sentada ao lado da porta onde as pessoas entram, onde o letreiro vermelho escrito entrada parecia rir dela.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Sakura


Durmiu abraçado a sua boneca de cabelos vermelhos, que era chamada de Sakura por causa de algum desenho japonês. Aquele garoto de 14 anos, já homem, que para os colegas era o pegador de mulher, no fundo no fundo não passava de um garoto que brincava de boneca escondido.
Sonhava com seu mundinho enquanto se aquecia no cobertor elétrico, dedão na boca, abraçado a boneca comprada via internet. No criado mudo, restos de um baseado queimado. Cinzas no chão.
Acordou, guardou a boneca, vestiu-se de preto e saiu, ia dar um role e contar vantagem das minas que já tinha pego no seu grupinho de amigos.